Em mais um episódio da saga inspirada na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que excluiu o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do PIS/Cofins, conhecida como a “tese do século”, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) publicou parecer (SEI nº 14.483) favorável ao contribuinte que busca a devolução dos valores pagos indevidamente.
No parecer, o órgão esclarece que as empresas tributadas pelo sistema não cumulativo poderão manter a parcela de ICMS embutida nos créditos de PIS/Cofins apurados nas operações de entrada. Essa interpretação contraria o entendimento da Receita Federal que, em agosto deste ano, emitiu o Parecer Cosit nº 10/2021, indicando que a decisão do STF tem como consequência a devolução, pelo contribuinte, do ICMS embutido nos créditos.
“Depois de mais uma tentativa da Receita para minimizar o rombo aos cofres públicos provocado pela decisão do STF, a PGFN, enfim, sinaliza que não vai executar as empresas que deixaram de excluir o imposto estadual nas operações de entrada, explica Régis Pallotta Trigo, do Hondatar Advogados. Mas o contribuinte deve ficar atento, avisa o advogado, pois essa interpretação não exclui completamente a possibilidade de autuação pela Receita.
Em decisão histórica no dia 13 de maio deste ano, o STF decidiu finalmente pela manutenção do entendimento de que o ICMS destacado no documento fiscal não pode integrar a base de cálculo das Contribuições para PIS/Cofins.
O entendimento aguardado há duas décadas deve produzir impactos expressivos para o caixa das médias e grandes empresas dos setores da indústria, comércio e serviços, tributadas pelo lucro presumido e real, que poderão recuperar o imposto pago indevidamente por, no mínimo, cinco anos.
Estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), encomendado pelo jornal Valor Econômico, mostra que a derrota da União pode ter gerado uma sangria de R$ 358 bilhões aos cofres do governo, em créditos fiscais para as empresas.
Na modulação dos efeitos, a Corte definiu que a exclusão do imposto estadual produzirá efeitos a partir de 15 de março de 2017, data do julgamento do mérito da ação. Assim, os contribuintes que entraram com ação judicial até essa data, terão o direito de excluir o ICMS da base de cálculo das contribuições, considerando o período de cinco anos anteriores à data do processo.
Já as empresas que buscaram a via judicial após 15 de março de 2017, ou os contribuintes que desejam ingressar com ação judicial, terão direito à devolução das contribuições do Pis/Cofins pagas a maior a partir dessa data e, também, a excluírem o ICMS da base de cálculo.
De acordo com Rodrigo Lima, sócio responsável pela área tributária na Martinelli Auditores, que analisa a situação dos clientes da King Contabilidade, é importante que as empresas que ainda não entraram com ação avaliem a melhor forma para a recuperação dos valores e custo-benefício da decisão.
Uma das possibilidades é retificar os arquivos do passado e fazer as compensações dos valores pagos a maior pela via administrativa. Outra opção é ingressar com ação, recuperando os valores sem precisar retificar os arquivos. Vale lembrar que os contribuintes que optarem pela via judicial, ao terem direito aos créditos, poderão escolher a compensação ou o recebimento por precatórios.
“Receber por meio de precatórios pode ser vantajoso nos casos de valores de créditos muito altos, pois o contribuinte só poderá fazer a compensação no prazo de cinco anos após o reconhecimento dos créditos”, explica o consultor. Além disso, é preciso avaliar com cuidado a decisão de retificar os arquivos do passado das empresas. O ponto positivo da via administrativa é a simplificação e a rapidez no processo de devolução dos valores.
Uma das ações judiciais movidas antes da decisão do STF tem como autor o Sindilojas-SP. O Mandado de Segurança coletivo foi ajuizado em dezembro de 2006 em favor dos associados do Sindicato.
De acordo com Augusto Brederodes, do Monteiro e Monteiro Advogados Associados, a ação transitou em julgado favoravelmente em outubro de 2018. “Pelo fato de ter sido protocolada em dezembro de 2006, dá legitimidade aos associados recuperarem os valores pagos a maior desde dezembro de 2001 até os dias atuais, ou seja, 20 anos”, explica o advogado.
Podem se beneficiar da ação todas as empresas varejistas com matriz em São Paulo, associadas ao Sindicato e que formalmente aderirem ao título judicial. Os lojistas interessados podem formalizar a adesão e solicitarem a compensação ou o ressarcimento. Cerca de 300 empresas do comércio já se beneficiam da ação.
“Não há como mensurar o valor do crédito antecipadamente, pois varia de acordo com o modelo de operação da empresa. Há casos em que os valores chegam ao patamar de 2% sobre a receita bruta da empresa, nos últimos 20 anos. São valores consideráveis”, analisa o advogado.
Para Regis Pallotta Trigo, do Hondatar, não há qualquer impedimento para que as empresas aproveitem os benefícios de uma ação coletiva e outra individual, desde que sejam respeitados os procedimentos administrativos de habilitação dos créditos, sobretudo em relação à segregação dos períodos relativos a cada ação judicial, comprovando que não há aproveitamento de valores em duplicidade. “Em geral, muitas empresas não têm conhecimento do ajuizamento de uma ação coletiva pela sua entidade”, disse.
Fonte: Diário do Comércio